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POESIA, UM MERGULHO NO COTIDIANO


O Programa Liberdade de Expressão gravado dia 19 de maio de 2008, apresentado por Miguel Farias, debateu sobre a POESIA, UM MERGULHO NO COTIDIANO DA VIDA, reunindo poetas, importantes, que falaram sobre o ofícia de poetar.


Na mesa de debates, os poetas WALMIR JORDÃO, VERA PORTO, SELMA RATIS, MIGUEL FARIAS, CIDA PEDROSA, IVAN ALMEIDA E MIRÓ

Em um perfil haikai do poeta Valmir Jordão, poderia ser escrito: irreverente, meado de altura, um feroz humor. Autor de versos que hoje correm mundo, tão antológicos que viraram quase domínio público, “Coca para os ricos / Cola para os pobres / Coca-Cola? é isso aí”, o poeta Valmir não só corre o mundo em versos, também corre perigo em pessoa. Digo que o poeta corre perigo em pessoa e não escrevo isso por ser um fingidor. Valmir Jordão vem de uma geração que se convencionou chamar de poetas marginais do Recife, que perdeu três, de uma só partida, em 2007: Chico Espinhara, Erickson Luna e França, nessa ordem. Chamados de poetas marginais por incompreensão ou preguiça, com mais propriedade poderia ser dito que ele é herdeiro de uma geração de poetas radicais, que escrevem poesia além das páginas, na própria vida, no próprio corpo. Como uma tatuagem.

Desse estigma, ele próprio já disse, exaltado: “Marginal é a poesia, desde que Platão a expulsou. Repito isso: marginal é a poesia, desde que Platão a expulsou da República, certo? Então não tem nada a ver com poeta marginal, porque eu nunca assaltei ninguém, nunca matei ninguém”. Apenas, e isto é um crime para uma tradição de poetas que cantam o belo do rio sem olhar suas margens, Valmir Jordão é o guerrilheiro deste petardo:
AH, RECIFE
Dizem os bardos que uma cidadeé feitade homens,com várias mãoseo sentimento do mundo.
Assim Recife nasceu no caisde um azul marinho e celestial,onde suas artérias evocam:
Aurora, Saudade, Concórdia,Soledade,União, Prazeres, Alegria e Glória.

POETA CIDA PEDROSA
Cida Pedrosa (Bodocó, Sertão de Pernambuco, 1963). É poeta e edita em parceria com Sennor Ramos a Interpoética. Publicou Restos do fim (1982); O cavaleiro da epifania (1986); Cântaro (2000) e Gume (2005). Participou de várias antologias. É uma das organizadoras da RECITATA - Concurso de Recitação do Festival Recifense de Literatura e vem se dedicando a estudar as interfaces entre a literatura, mídias e tecnologias. Foi uma das coordenadoras do Movimento de Escritores Independentes de Pernambuco

Fonte: Breno Pessoa/Jornal do Commercio
É possível definir o novo livro da poeta Cida Pedrosa como um abecedário de mulheres. De Angélica a Zenaide, são 26 poemas/personagens femininas, cada uma correspondente a uma letra do alfabeto. A obra, chamada As filhas de Lilith, será apresentada ao público hoje, às 20h45, durante leitura no espaço Café Literário.
Apesar de estar finalizada, a coletânea ainda não foi editada nem publicada de fato. A idéia da autora é fazer neste sábado um “teste público” do seu trabalho, recitando parte de As filhas de Lilith ao lado da atriz Silvana Menezes. Cida pretende apresentar 14 poemas e espera que alguma editora se interesse em viabilizar a publicação.
“Cansei de passar o chapéu entre os amigos, diz a escritora, que publicou seus quatro livros anteriores de forma independente e é editora do portal de literatura Interpoética (www.interpoetica.com). A autora também está à procura de uma artista (sim, deve ser uma mulher porque a proposta é que o livro seja inteiramente feminino, até na sua produção) que se disponha a ilustrar o trabalho.
Mas qual a razão do título? Segundo algumas interpretações da Bíblia, Lilith é tida como a primeira mulher de Adão, que havia se rebelado por não concordar em ser subserviente ao homem. “Existe uma frase atribuída a Lilith que gosto muito: ‘Adão, por que estás por cima de mim, se és tão pesado?’”, comenta Cida sobre a personagem do título. Esse questionamento e vontade de emancipação estão presentes, de alguma forma, em todas as mulheres da obra.
E embora o livro não possa ser definido como uma obra erótica, a sensualidade e sexualidade predominam nos versos. E talvez esse seja justamente um dos destaques no trabalho da escritora. Desde que a francesa Pauline Réage revelou ao mundo ser a autora de História de O, um dos maiores clássicos da literatura erótica, caiu parte do estigma de que esse era um segmento dominado apenas pelos homens. Ainda assim, são poucas as representantes femininas no gênero, sobretudo na atualidade e, principalmente, na poesia.
“Faço poesia erótica sem papas na língua”, afirma Cida, “mas acho que esté livro é mais sociológico”, completa. A autora diz que sua proposta é aprofundar-se em diversas personalidades femininas: a dona-de-casa, a moça vaidosa, o travesti e a lésbica são alguns dos personagens presentes no texto.
As personagens tornam-se críveis por serem pessoas comuns, em situações prosaicas, muitas delas envolvendo o sexo, que acaba surgindo nos poemas de como algo natural e bastante pessoal em cada uma das identidades. E, embora bem reais, a poeta garante que a inspiração para os textos não veio de experiências vividas, e sim de sua imaginação.

MORTE SOB O CARBONO

a floresta (dentro
da sala)
espia o homem
que se apóia na caneta

nomes números nódoas

as velhas esperam
o ventilador gira
o café esfria o bigode do funcionário

- papel poeira pesares ?
- idades vãs ?
entre
um documento e outro
um carimbo e outro
uma certidão e outra
as velhas
acertam um grampo na alma
e pactuam um prazo com a morte

(No livro Gume, Recife: ed. da autora, 2005, p. 55)
Arte e editoração
EROTISMO, HUMOR E SIMPLICIDADE
NA POESIA DE SELMA RATIS

por André Cervinskis*

Quando se fala em literatura erótica está se falando de uma literatura que mobiliza um tema específico: a sexualidade. Um campo da literatura que se interrelaciona com diversos gêneros. Segundo a pesquisadora Eliane Robert Moraes, estudiosa do assunto e autora de Sade – A felicidade libertina, em entrevista à Livraria Cultura News de março de 2007, existem obras que enfocam o universo, as pessoas e os sentimentos, a partir do sexo. Essa distinção é muito complexa e, geralmente, baseia-se num critério moral. Para o senso comum, é pornográfico o sexo escancarado e é erótico aquilo que é velado. O que se deve levar em conta, porém, é a qualidade literária, e isso deve ser avaliado pelo critério estético, não pelo critério moral. Há livros em que o sexo é meio velado, mas a literatura é ruim e há outros mais alusivos que são notáveis pelas possibilidades de pensamento que propõem.

O sexo vem sendo tema literário desde sempre. Está no Satyricon, de Petrônio, no Cântico dos Cânticos, da Bíblia, na Priapéia grega e em tantos outros escritos da Antiguidade. Poesia erótica, notável tradução de José Paulo Paes, que abrange desde a Antiguidade até os dias de hoje, permite-nos acompanhar e pensar a história da literatura erótica, mostrando inclusive que ela sempre foi um dos temas essenciais da humanidade, assim como o amor, a guerra, a religião. No século 16, portanto na modernidade, surge no Ocidente um tipo específico de literatura que fornece as convenções do erotismo moderno. O grande exemplo é Diálogo das Cortesãs, de Areno, em que duas mulheres avaliam o que é melhor para uma jovem – ser esposa, cortesã ou freira. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais (1941), de Mikhail Bakhtin, rechaça a norma unívoca e a rigidez dos padrões e estilos. Disserta sobre o grotesco na Idade Média e Renascimento, revelando hábitos sexuais nem sempre condizentes com as normas sociais da época. Esse modelo, exposto pelos próprios personagens, fonte da literatura libertina, vai perdurar até o século 18, inspirando romances clássicos franceses e ingleses, como Fanny Hill e uma boa parte dos escritos de Sade. Depois das revoluções burguesas na Europa, o erotismo passa a ser mais clandestino. Há um desejo de recato, de distanciamento do mundo da corte e, em decorrência, um retrocesso de sua visibilidade. No século 20, com o esgarçamento do modelo burguês, ocorre uma nova virada. Surgem os movimentos de vanguarda nas artes e os surrealistas no início dos anos 1920, resgatando o vigoroso acervo dos séculos 17 e 18, que estava escondido, intensificando a produção dessa literatura. Entre os nomes de destaque estão Louis Aragon, Guillaume Apollinaire, Pierre Louÿs, Georges Bataille.

O novo livro de Selma Ratis, conhecida no meio literário por sua poesia sensual e irreverente, Falo, do que Falo!, é uma prova de que poesia erótica se faz com humor e simplicidade, além de uma boa dose de sensualidade, é claro. Sem pudores, a autora toca em temas ainda tabus na sociedade hodierna, como a masturbação feminina: Mas, confesso,/ Ainda penso em você/ Quando faço amor/ Sozinha. (ESQUECEU MESMO?, p. 2); ou mesmo posições eróticas pouco tradicionais: Você me amar/ Por trás/ De algum coqueiro./ Melhor ainda/ No banheiro. (MINHA FANTASIA, p. 24)

Os versos certamente são ousados, mas bem construídos: Suas mãos correm/ Pelas minhas pernas/ E sobem... E descem.../ enquanto seus pés/ Servem de estacas/ Para o desejo. (FIM DE FESTA, p. 42); Por que me molhar com água/ quando estou molhada de amor?/ Por que lavar teus beijos?/ Por que deixar escorregar/ Pelo ralo do banheiro/ As palavras ditas ou ouvidas?/ Por que afogar a satisfação/ Da minha pele relaxada/ De prazer?/ Por que deverei/ Apagar de mim, você? (BANHO, NÃO!, p. 8). Em versos monossilábicos, Selma enfatiza, em ritmo sôfrego, o carnaval e a luxúria: Carnaval/ Insanidade/ Vontade/ De beijar/ Na boca./ Manhã de sol/ Saudade/ Vontade/ De beijar/ na boca./ Praia/ cumplicidade/ Vontade/ De beijar/ Na boca. (FICÇÃO, p. 40)

A desenvoltura com que ela trabalha sensualidade e erotismo sem dúvida é um dos traços principais dessa obra. Mas o humor sem dúvida é uma das principais característico desse que pode ser considerado o livro da maturidade erótica de Selma Ratis: Pra ficar com alguém/ Assim, eu não ia/ Precisar de camisinha./ Mas colocá-lo dentro/ De um camisão. (PAQUERA, p. 3). Brincando com termos chulos, trata com jocosidade as preliminares do coito: Quando você me disse:/ Quero lhe comer/ Começando pelos braços/ Mordendo suas coxas/ Suas costas/ Saboreando seus seios,/ Suas ancas/ levei um susto:/ Pensara em outra coisa. (QUERO LHE COMER, p. 5). Ou tornando mais leve uma das maiores preocupações masculinas, o uso da camisinha e a potência: Se o amor/ Não cabe mais em nós/ Que alegria!/ Se o tesão/ Me faz esquecer o tempo/ em que fiquei sozinha./ Vem! Deixa eu colocar/ Logo esta camisinha! (CHEGOU A HORA, p. 14). Aliás, interessante alusão à relação futebol-virilidade realiza no poema AMAR: É como no futebol? Amar você assim./ A barra é o lençol/ o gol é você em mim. (p. 16).

Há uma consciência plena da autora sobre o ser mulher; ela agradece à sua progenitora a felicidade de ter-lhe dado e ensinado a feminilidade (p. 100), ao mesmo tempo em que disserta sobre a diferente visão de sexo para homens e mulheres: Quero ser amada, ter certeza/ De ser absoluta. (...) Porque pelos meus cálculos você é:/ ‘umas duas horas de homem/ e eu, uns quarenta minutos de mulher’ (p. 12); Tu me entendes/ Também és mulher!/ o sofrimento, aquela lágrima/ pelo amor que vivi/ E se perdeu/ (...) As juras de amor/ As minhas, as deles/ Tão diferentes/ Se desfazendo/ Em teus recantos tão sensuais! (CANÇÃO DE AMOR, p. 29); Os homens fazem sexo/ As mulheres fazem amor/ (...) faz parte do prazer/ continuar sentindo seu calor/ Afagar suas costas./ Percorrer de volta o caminho/ De sensações e espasmos/ com quem se gosta. (POR QUÊ?,55).

Mas, para quem pensa que a poesia de Selma Ratis é somente erotismo, ela dá uma lição de lirismo no poema PORTO ARTHUR, provando que amor não está desassociado da sexualidade, mas se complementam. Associando o mar à saudade, lembra-nos Fernando Pessoa: Há quantos anos/ Vives? Ancorando/ Embarcações/ De esperança e dor./ Descarregando/ Em teu solo/ a semente/ Da saudade./ Refletindo/ Em tuas águas/ a profundidade/ De um olhar/ Tristonho/ enigmático/ Ou quem sabe/ A alegria/ Do reencontro./ Também tenho/ Um porto/ Que naufragou/ Levando a jangada/ do meu coração/ Deixando um mar/ De lágrimas/ Nos meus sonhos!/ Porto Arthur... (p. 85). E aos que enxergam na poesia somente a catarse de seus sentimentos, versos confessionais que não levam em conta a qualidade literária, avisa: Detesto escrever/ Para chorar mágoas (TAMBABA, p. 9). A relação literatura e sexualidade é trabalhada pela autora no poema TENHO QUE ESCOLHER: Ou leio Neruda/ E paro de pensar/ Em você na cama/ Ou penso em você/ Na cama e paro/ De ler Neruda.(p. 36). Noutra intertextualidade interessante, faz referência à obra de outra grande autora pernambucana, que inclusive domina uma poesia erótica elegante: Quando li o poema de Tereza Tenório -/ Canção do Degredo/ “... Eu princesa da corte/ Apaixonada./ Flagrei meu homem/ amado em pleno beijo/ com o cavaleiro branco/ A quem me queixo?” Uma última informação importante: seu poema DE DIA (p. 45) foi musicado pelo Grupo Bondsamba.

Erotismo, simplicidade e humor são, sem dúvida, as marcas indeléveis dessa obra e de toda a trajetória literária da autora. Não a leiam os pudicos, os que enxergam a poesia como matéria intocável e sagrada, distante do cotidiano, das coisas e desejos que fazem de nós seres humanos. Leiam-na, sim , os que percebem a poeticidade do desejo, o amor construído em detalhes e coisas simples, como: cozinhar caranguejo,/ olhar aviões no aeroporto/ temperar munguzá/ raspar coco pra tapioca (PERNAMBUCANIDADE NO AMOR, p. 15).

  • ANDRÉ CERVINSKIS, escritor, crítico literário e mestrando em Lingüística - Universidade Federal da Paraíba







VERA PORTO é compositora e cantora e a compositora é a poeta do OVO DE SEU FRANCISCO

O OVO de FRANCISCO
( Vera Porto)

Um senhor de olhos negros plantou a um tempo atrás
Uma flor chamada estranha
Ninguém vira jamais

Um forno- dado medonho
Pedra- por- pedra é capáz
de agigantar o humano
E construir muito mais

Aos guardiões do tempo
Dá-me licença de entrar

No templo uma muralha
Guardiões do lugar
Preparam a sua alma
Para o que dentro virá

Um forno-dado medonho
Pedra-por-pedra é capaz
De ver que dento do ovo
Principia a luz do fogo que inicia o que virá...
Carneficina-oficina
A forma curva o que há
De violento na vida
O nascer o principiar
Da matéria a argila
o senhor fez plantação
Na Vársea de sua fibra
A boca é sua mão.

Bom encontrar uma poeta como a Vera, que declama poesias com sua voz especial e seu cantar que transpira o que você puder imaginar. Salve Vera!
Garanto que procurei um texto especial, na internet, para falar do Ivan Almeida. Queria apertar o ctrl+c e colar aqui no blog. Não encontrei e resolvi escrever sobre este cara que encontro em todas as esquinas de Olinda, sempre risonho e feliz com seu ofício de poetar nos dias e noites de recifolinda, nos bares, ruelas, onde tenha gente ele está lá. O Ivan é um mágico! Tem um sorriso franco e consegue fazer que olhemos para ele, sempre esperando uma mensagem de bom augurio (que palavra estranha!).

Não poderia deixar este espaço em branco. Este poeta como já disse é mágico, transforma palavras em sonhos, em risos, em alegria e aquece o coração de quem aspira, respira, transpira o bem e ele é do bem inteiro.


Poeta.... Se as palavras são a tua vida, podes crer que consegues fazer viver corações e mentes que em certos momentos estão absorvidos pelas correrias dessa vida que consegue nos robotizar e só a poesia e o poeta prá transformar essa pressão toda.
Dele recebi dois poemas e com prazer transcrevo-os aqui:

MÃE

Mãe é amor
Dedicação
Mãe é total doação
Mãe é ar
É sangue
É pulmão
Proteção mesmo distante
Em desespero quantos gritos
Mamãeeeeeeeeeeeeeeeee!
O temor invadindo
E o bálsamo aproximando-se
Que confiança nós temos nela!
É divino é divina
É minha flor
minha rainha
Mãe tanto se dá
Tão pouco me dou
Tanto me faz
com amor
Sinto amor
Sinto paixão
Vejo esta santa mulher
Em tudo que Deus criou
Vejo nas plantas
No fogo
Vejo no céu
No mar, no ar!
Uma rosa é mãe
Uma borboleta
Julias e Julietas
Inaladas, Martas, Marias e Antonietas

Todas as mães

Se já é uma estrela pense nela
com o mesmo amor qye você pensa
Em Deus Nosso Senhor

Benção minha mãe

Benção todas as mães


(Ivan Almeida)





AO MEU AMOR





Ha anos amo a mesma pessoa


O que dizer depois de tanto tempo?


Querendo...


Convicendo...


Sentindo o corpo e a alma feliz


Vejo a mesma coisa nela


Isso é o que os seus olhos, cheiro, pele, me dizem


Tantos anos querendo e tendo


Tenho esperança que seja eterno


Mais dez, cinquenta, cem, sei lá!


Se dentre este tempo eu morrer


A esperarei com uma legião de anjos


Com direito a toques e trombetas


Neste tempo de união a vi dedicar-se a nós


Lágrimas também já vi


Já fizemos amor até em pensamento


Já rolamos na cama


Na grama


Já tive o prazer de ve-la me esperando...


Os olhos chegaram a engolir a estrada


Juntos vimos o sol e o parque verdejante


Dando-me certeza da beleza


Que é o verdadeiro amor


Que o meu seja eterno com você


Não que as outras pessoas não me mereçam


Mas você me basta


Em você tenho tudo!


(Ivan Almeida





Ivan é o poeta do amor, o poeta dependente do amor, reconhecidamente dependente da mulher, declaradamente um poeta que canta e doa sua alma para a mulher. Ap ´peta, minha amizade e admiração só de pensar que para cumprir um compromisso poético você saiu de Ouro Preto até a Caxangá de bicicleta,,,,,,,,,,,,,,,



maristela farias
MIRÓ

Um poeta marginal
Por Urariano Mota

Senhores e senhoras, temos a grata satisfação de falar de Miró. Sobre ele é quase inútil procurar informações no Google, porque entre os 35.700.000 resultados no máximo 4 se referem ao particular Miró que lhes apresentamos agora. De nome de batismo João Flávio Cordeiro da Silva, o poeta Miró nasceu no Recife há 46 anos. Mas nada nesse nome artístico vem do outro mais conhecido, um outro grande, um certo criador Joan, da convivência de João Cabral de Melo Neto. Não. Esse Miró, esse nome nobre... - e já sinto no ventre a cutilada do poeta – “todo nome é nobre” – essa denominação vem de outras plagas nobres. Vem de lá dos subúrbios do Recife. João Flávio foi transformado em Miró pelos amigos, porque lembrava ao jogar o bom Mirobaldo, um craque da pelota do Santa Cruz Futebol Clube. No tempo em que o maior talento de João era o futebol, os seus amigos o apelidaram de Miró, forma reduzida de Mirobaldo, que se pronuncia com a vogal aberta no hablar nordestino. Depois, na fase em que assumiu o jogo mais raro e difícil da poesia, achou por bem continuar assim, Miró, para melhor sorrir no íntimo com os dentes claros, diante de quem o confunde com o pintor catalão.

Em um mundo globalizado conforme a ótica WASP, Miró é um acúmulo de surpresas. Pois imaginem as senhoras ladies e os senhores gentlemen que ele é um poeta que jamais entrou na universidade. Pelo menos, para assistir a lições como estudante universitário, nunca. E, continuem a imaginar, isto não lhe faz nenhuma falta, devíamos mesmo dizer, para a sua poesia é um bem, porque lê e se educa em obediência a uma ordem que não está no currículo de uma tradição estéril. A quem não o conhece, a sua pessoa, física, guarda uma grata e grada graça: Miró tem a pele escura, e, ladies and gentlemen, não finjam por favor naturalidade. Mesmo em um povo mestiço, Miró é uma exceção: as pessoas sensíveis, até mesmo no Brasil, têm uma estranha gradação na cor da pele da sua sensibilidade. Quanto mais claros, mais poetas. Quanto mais escuros, mais trabalhadores braçais, ou, se forem artistas, mais jogadores de futebol. Daí que faz sentido o poeta Miró vir de Mirobaldo, o craque do Santa Cruz Futebol Clube. Pero a melhor surpresa de Miró vem da sua poesia. Acompanhem-nos, por favor, assim como o acompanhamos esta semana em um auditório.

Todos nós aprendemos, ou fomos como bons estúpidos para isto educados, que o poema realiza a poesia nas suas linhas. Ou, se quiserem, o poema não precisa da pessoa do poeta – a certeza única e exclusiva do seu valor está no que escreve. Certo? Senhores e senhoras, ladies and gentlemen, e Jesús na Espanha nos ajude para o senõres y señoras: - Errado. Quem não viu Miró declamar os seus poemas não sabe o quanto este conceito, preconceito, esta burrice ancestral está errada. Aquela justa observação feita por Manuel Bandeira à poesia de Ascenso Ferreira, no trecho

"Não me lembro se antes de me avistar pela primeira vez com Ascenso Ferreira eu já tinha conhecimento dos seus versos. Como quer que fosse, eles foram para mim, na voz do poeta, uma revelação. Pois quem não ouviu Ascenso dizer, cantar, declamar, rezar, cuspir, dançar, arrotar os seus poemas, não pode fazer idéia das virtualidades verbais neles contidas, do movimento lírico que lhes imprime o autor"

aplica-se também à poesia de Miró. Com alguns câmbios. Mirem. Onde Ascenso Ferreira realizava no recitar um uso extraordinário da voz, da modulação ao acento, do corte da sílaba à ênfase, como dizê-lo?, uma utilização da voz como um ator de rádio, Miró usa a imagem, física, melhor dizendo, ele usa o próprio corpo, ele faz evoluções pelo auditório, como um cantor de rap, quase diríamos. Mas sem microfone. E não só. Ele acrescenta caretas, esbugalha os olhos, fecha-os, e aponta os seus versos com um dedo contra a assistência. Como um Tio Sam invertido, que em vez de conclamar um alistamento, nos enfiasse a realidade cara a dentro:

- Tomem poesia, seus filhos da puta!

A platéia, divertida, sorri, gargalha, diante de versos que não chegam a ser bem cômicos. Como aqui:

“Tinha lido num livro de auto-ajuda, de um
desses psicólogos
De araque, que aparecem nesses
programas matinais que dão
Receitas pra tudo, inclusive de bolo,
Que na hora que a vida vira uma merda
O melhor é sair da fossa”

Ou nestes versos

“Acho que foi a primeira vez que conheci a dor
Um domingo de 1971
Naquele tempo o domingo era o dia mais
feliz,
Minha mãe fazia um macarrão com carne de
lata e Q-suco
Ficávamos brincando de mostrar a língua
vermelha
Pra provar que éramos felizes....

Norma era tão linda com seus cabelos
negros,
Que me deu um branco aos 11 anos
Quando me pediu um biscoito maizena e um
gole de fratele vita ....

Domingo era o dia mais feliz
Antes de Norma beijar um outro na boca”

A platéia, o distinto público, vai ao delírio. De rir, de gargalhar. Miró fala de um mundo abaixo do nível do auditório. O primeiro elemento cômico é que a miséria é cômica. A maior comicidade é a desgraça que não sentimos na própria pele. A dor que não é a nossa, a dor pela qual não temos empatia, ah, ladies and gentlemen, como é cômica. Não iremos consultar nada agora, mas em algum lugar deve estar observado que o riso é manifestação pela desgraça alheia. O riso atesta a nossa superioridade ante o ridículo que não nos alcança. Quem jamais bebeu “sucos” em pacotinhos de pó, de “morango”, de “uva”, com bastante açúcar e gelo, como bebem os que não podem comprar frutas em um país tropical, acha isto irresistivelmente cômico.Quem jamais saboreou carne enlatada no país de maior rebanho bovino do mundo, quem jamais pôde sentir o sabor, o gosto e a maravilha da carne Swift, da carne da Wilson, com macarrão rubro de colorau aos domingos, porra, que piada genial é esse macarrão se transformar no dia da felicidade. E aquela prova de amor, da cumplicidade que tem o amor, quando a musa pede refrigerante, guaraná da frattelli vita, com o biscoito miserável de maisena. Caralho, esse cara é do peru! E Norma beija um outro, mirem o detalhe, na boca! na boca! Menos, por favor, você é demais, cara!

O poeta gira em torno da assistência. A sua arma, a sua graça e cômico é a verdade. Aquelas coisas mínimas, constrangedoras, que nem às paredes confessamos, ele, como um novo louco, arrebenta de si. Mais do que escrever por vezes transcreve. Com uma sensibilidade que observa o inobservável.

“Já perceberam como tem pontas de
cigarro em pontos de ônibus?
Tem uma tese de um amigo que diz:
Que as empresas de ônibus são
responsáveis por 5% dos cânceres de
pulmão.
Curioso perguntei, como assim?
É que os ônibus demoram”.

Ou mesmo, vejam que engraçado:

“O amor passou na tarde
Com a mão direita sobre o ombro de um
filho com síndrome de Down ...

Aldeota, um jumento espera inquieto a
volta do seu dono que foi tomar uma
sopinha com pão, com o dinheiro das
migalhas que catou.
E eu fiquei tão emocionado,
Que não consegui escrever mais nada”.

A recepção da platéia a essas coisas é vê-las apenas como o lado sujo, trash, de uma estética suja e trash, de um maluco que escreve e não tem nenhuma vergonha de escrever sobre essa miséria como um bárbaro sem educação. (Nós, os cultos. Nós, os que, se algum dia fomos dessa desgraça, bem que a superamos. Nós, os de outro mundo. Nós, os limpos, cleans e educados.) O poeta gira, e deixa a aparência, como um bom gira, de fazer também uma rotação. Então ele declama, recita, pula, contorce-se, cospe e pragueja uns versos que a expectativa do distinto e cultíssimo público não percebe. O clima em torno da sua performance não permite a degustação, a permanência que tem a beleza, a que sempre por necessidade voltamos. Então ele fala, enquanto o público espera dar mais uma risada, então ele faz uma prece, um poema que somente hoje pela manhã pudemos sentir, ao ler e mastigar e ruminar como as cabras mastigam e ruminam uma erva muito amarga. Esse poema não precisa do poeta. Da sua pessoa. Basta uma sensibilidade.

“Deus, Tu que agora carregas um homem,
Puxando pelas rédeas o seu cavalo e uns
sacos de cimento
De cada lado um sol insuportável ...
Deus,
Choves agora no meu coração
Para que eu não pense em comprar um
guarda-chuvas de balas
E fazer justiça com as próprias mãos.”

Esses versos preencheram toda esta manhã de hoje. Dormiram e não saíram do peito todo este dia. Talvez porque nos tenham recordado de outro João, de Os corações futuristas, que pleno de álcool em 1973 também se sentiu impotente e louco de justiça.

Deus, choves agora no meu coração
Para que eu não pense em comprar um
guarda-chuvas de balas

Miró, poeta marginal? Pobre e miserável quem o toma assim


VERA PORTO, que voce encontra no site http://www.myspace.com/veraporto


VERA PORTO E BANDA VERA PORTO E BANDA
VERA PORTO
LEONARDO E AMADA
UM DOS MENINOS DA VERA
OUTRO MENINO DA BANDA DA VERA
AMIGA DA VERA

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enviada por: programaliberdadedeexpressaonatv em: 23:02 - 07/06    |    permalink    |    0 comentários    |    comentar

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